terça-feira, 8 de dezembro de 2015

A matança do reco

                    Tradição que não morre 

Em dia de feriado, em honra da Imaculada Conceição, o senhor Eduardo não matou uma, nem duas, mas três grandes cevas.


Na matança dos porcos juntaram-se-lhe quatro vizinhos.

 Um deles, na transição para a adolescência foi assistente de matador.


Herdeiro de uma tradição que se perde no tempo, o matador, hoje, é ele!



A solidariedade nas relações de vizinhança da gente raiana, remontando a tempos que se perdem nas brumas do passado, ainda é o que era, um forte fator de coesão  social.



Assente na torna-jeira, a entre-ajuda, vinda do tempo em que a circulação de dinheiro era diminuta,  foi o sistema de organização do trabalho que as comunidades rurais criaram para sobreviver ao isolamento, à adversidade do relevo, do clima  e à escassez de recursos económico-naturais.



Às mulheres não está reservada a função de meras espectadoras  de um ritual em que o elemento masculino  é  o rei. 


No dia da matança as senhoras entram em ação, na coagulação do sangue;  na lavagem das tripas e na feitura da primeira refeição com carne da ceva. Dias depois, participam no desmanche do suíno e são elas a fazer o fumeiro, para goberno da casa ao longo do ano.



O ritual passa por quatro operações fundamentais: matar a marrã, chamuscá-la, lavá-la e abri.la, deixando-a a enrijar um dia ou dois, antes  do desmanche.


O feriado em honra da padroeira de Portugal, amanheceu com nevoeiro e  pluvioso. Às 8h30 o cuincar do primeiro reco ecoou pela aldeia. Seguiram-se os outros dois berrantes. Mas em Travancas há quem use pistola silenciadora.



Devido à chuva, os recos foram levados para  o interior do armazém, onde foram chamuscados e abertos.


A força necessária de vários homens para colocá-los no trator.



Antigamente chamuscava-se a pele do reco com palha de centeio ou carqueja.


Agora usa-se o maçarico a gás. Com ele torna-se mais fácil raspar a pele, com faca e sachola; limpar orelhas e arrancar as unhas.


A divisão do trabalho  - tarefas diferentes em simultâneo  - evidencia organização, fruto de experiência .



Lavagem e raspagem com pedra áspera.





Abrindo o reco, para retirar as miúdezas.


Da barriga fazem-se os rojões. Comidos à refeição, com grelos e batatas cozidas, ou com naco de pão, são sempre saborosos.







Tudo se aproveita para o fumeiro; até as tripas, depois de bem lavadas, para enchimento de alheiras, chouriças e salpicões.


Três horas depois, a matança dos recos chega ao fim. Dentro de dois dias faz-se o desmanche.


Satisfação, seguida  da festa da abundância, almoço no qual se comem os rojões e as primeiras carnes da marrã.  

Em conclusão, pelas terras da raia, a tradição ainda é quem mais ordena!


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