quarta-feira, 2 de abril de 2014

Dor sem fronteiras

Pobos da raia xuntos no adeus a Manolo

Homenagem dos camaradas socialistas de Vilardevós,  município a que pertence Arzádegos. Numa autarquia governada pelo Partido Popular, Manolo, socialista da velha guarda antifranquista, foi conselheiro municipal (vereador) durante muitos anos. "Era amigo dos pobres", assegura a senhora com quem troco algumas palavras.



O funeral de Dom Manuel Alvarez Alvarez realizou-se ao fim da tarde  de hoje, em Arçádegos, aldeia vizinha de Travancas, do outro lado da fronteira.



Não conhecia o Manolo. Foi o Nicolau,  filho de pai português, contrabandista,  e de mãe galega, que ontem veio a casa dar-me a notícia do óbito de D. Manuel. Para enfatizar o bom relacionamento dele com os de Travancas, disse-me que tinha sido amigo do meu sogro, guarda-fiscal já falecido. Ambos, em comum, tinham terras de cultivo na fronteira do Vale Grande.



Para a missa de corpo  presente, a imponente igreja de Santa Baía ficou à cunha com gente de todos os lados, incluindo de Travancas. Por lá vi os senhores Silvério e Albano, além de outros.



Coroas de flores. Uma, de "Tu esposa"; outra, de "Tus hermanos políticos". Intrigado com a expressão "irmãos políticos", uma senhora, camarada socialista de Manolo, esclareceu-me que "hermanos politicos"  significa cunhados.



Já estive em Arçadegos diversas vezes mas nunca achei a aldeia tão bonita como hoje, vista do caminho do cemitério. Deste lado da encosta da Serra de Mairos também se tem uma bela vista de Florderrei,  aldeia vizinha situada na colina em frente a Arçádegos.




O "alcalde" de Vilardevós fez aqui um bom trabalho de recuperação e ajardinamento da "Ruta do Contrabando", numa extensão de 26 km. Em contrapartida, do lado português, a Câmara Municipal de Chaves nada tem feito que se veja, para recuperar, com fins turísticos e culturais, os caminhos usados pelos contrabandistas na "Rota de Travancas".



Chegada ao cemitério
Antigamente os contatos entre os dois lados da raia eram mais intensos que hoje. Ia-se a Arçádegos aos funerais, às festas de Santa Eulália, às compras.... e os galegos vinham mais às aldeias portuguesas. O contrabando também criava  conivências duradouras. Todavia, com a abolição das fronteiras alfandegárias houve negócios e afetos que se perderam.



Em Travancas, os mais velhos lembram-se bem de Manolo, morto aos 83 anos,  de  enfarte ou febre de malta, não me souberam precisar.

Sapateiro de profissão, antes de ser político, fez muito calçado e costuras para as gentes de Travancas. Vivências que o povo guarda na memória.



Majestosa acácia amarela, símbolo da imortalidade da alma, à entrada do cemitério.




Nos cemitérios das aldeias galegas da raia, os defuntos não são enterrados em campas, ficam engavetados, iguais na morte. Um costume bem diferente do nosso- 


Ata sempre, Manolo!


Alguns das Trabancas  deixando o cemitério, depois de cumprido o dever religioso, ético e moral de marcar presença nos funerais de vizinhos e amigos.


Toponímia, em galego. Se a placa da rua, com a Cruz de Malta no brasão de Vilardevós, estivesse escrita em castelhano chamar-se-ia  "Calle Arzádegos". É a primeira da aldeia, quando se chega das "Trabancas", ou a última, quando se deixa Arçádegos!


No regresso a Travancas, parei o carro, para ver, extasiado, o arco-íris, símbolo da aliança estabelecida entre Deus e os homens.  O arco aparece depois de cada chuva, para lembrar que, após o dilúvio, Deus nunca mais iria inundar a Terra.

Vista  parcial de Travancas,  com montes de Roriz ao fundo, quando se chega da fronteira.  
Bonito, non!


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